Fonte:
http://diarydebicicleta.blogspot.com.br/2010/12/8-viagem-barra-velha-sc.html
Neste tempo comemorativo de três
anos do Jornal Folha Parati e dos cinqüenta e um anos de emancipação política
de Barra Velha, nosso lugar-comum, deixo de escrever sobre educação para
escrever sobre o sentido do ninho, sobre o sentido do lugar de pertença, sobre
o significado de viver e habitar neste município – casa de todos! Nosso lugar
de pertencimento! Para isto, vou a um trecho retirado de um livro que recém
escrevi intitulado ‘O Carregador de Pedras’:
“Ao abrir a porta da sacada, no novo
apartamento de hospedagem, o carregador de pedras percebeu uma grande árvore
que sustentava um pequeno ninho em um galho. Ficou observando por algum tempo o
movimento dos pássaros que o visitavam em tempos intercalados para alimentar os
filhotes. A árvore – uma de muitas na avenida – hospedava em sua copa uma
família de pássaros que, por bom tempo, tecera cuidadosamente aquele ninho.
Enquanto
olhava, pensou: - Cada ninho tem uma arquitetura própria, um traçado, uma
configuração representando o que tal pássaro é. Mostra seu jeito de ser pássaro
na feitura do ninho. Todo ninho é abrigo, proteção, habitação e pertencimento,
mesmo que seja por pouco ou muito tempo. São muitos os tipos de ninhos e
variadas as suas formas. Nos ninhos imprimem os pássaros o que é mais forte em
sua natureza. Deixam ali os traçados de suas vidas, definem a continuidade de
seu viver.
Ficou por
um tempo contemplando o movimento dos pássaros e pensando sobre o sentido do
ninho na vida deles. Absorto naquela imagética entre especulação e poesia, foi
entrando em um universo paralelo e mergulhou no que a vida lhe apresentava de
mais desafiador – a construção do seu lugar no mundo.
Olhar a
dinâmica dos pássaros permitia pensar a sua própria, o seu existir. Pensou alto
– Muitas pessoas, nesse mundo, vivem longe de seus ninhos, distantes de seus
lugares, dos seus espaços vitais. Muitos seguem em várias direções. Vão para
aonde lhes convém ou podem em dado momento de suas histórias, sem jamais
esquecer dos lugares onde habitaram, a que pertenceram. Outros, apenas
frequentam determinados lugares sem poder habitar, pertencer e ser... Vivem
vidas que não são as suas!..
...Os
lugares que construímos para viver são únicos e só podem ser habitados por
quem, de fato, lhes pertence. Habitar, não como ato de apenas estar, passar ou
ficar, mas como ato de sentir-se, fazer-se parte, pertencer. Não habita com
sentido quem não pode pertencer...
...A
pertença é presença a se fazer cotidianamente. É movimento de tecelão que não
se nega adicionar fios e cores identificadores do lugar que se faz sua criação
e sua morada. Viver sem sentir, sem pertencer, sem coabitar... causa
estranheza. Viver habitando, onde for e qual for o ninho, desde que se
pertença... causa gozo, felicidade e força.
A imagem do
ninho estava levando o homem aos lugares de sua vida – lugares que construiu e
onde, por algum tempo, habitou e aos quais pertenceu. Mesmo distante, estava em
sintonia com os seus melhores lugares no mundo – sua casa e sua cidade. Não
podia ficar afastado deles, por isso as lembranças, os momentos de recordação
eram-lhe necessários. Ajudavam a continuar sua trajetória. Lembrar dos detalhes
da casa – seu ninho –, dos momentos vividos nele, ampliava a confiança, a
certeza de que precisava continuar, seguir até o final de sua viagem.
Por um
instante, aquele homem pensante pegou a mala das pedras, uma cadeira e
sentou-se na sacada. Ficou ali segurando aquela mala e olhava a vida acontecer
no ambiente externo. A avenida movimentada, a luta dos pássaros pela vida dos
filhotes, as pessoas que passavam nas calçadas, o barulho dos carros. Ele
estava ali naquele lugar porque havia feito uma escolha e uma promessa a si
mesmo. Estava num lugar que não lhe pertencia, mas servia de ponte. Um momento
necessário na vida de quem se aventurava a cumprir o que dava sentido a um
viver carregado de cumplicidade, buscas e relações compromissadas.
Pegou uma
das pedras nas mãos e disse para si mesmo – não há lugar melhor no mundo a
não ser o ninho no qual vivemos uns com os outros enfrentando tudo que a vida
nos propõe e nos desafia a viver. Não há lugar melhor para se habitar e
pertencer do que o lugar que construímos com as próprias mãos. O melhor lugar é
o lugar onde posso estar com quem a vida me presenteou.
Retirou outra pedra da mala e falou
– se eu pudesse, diria para as pessoas aproveitarem em cada novo dia, novo
agora, os cantos, os recantos, os detalhes, as minúcias dos lugares onde
habitam. Olhassem em volta para perceber em cada minúsculo espaço um pouco de
si mesmas, um pouco do que sonham, do que acreditam, do que esperam...
...Diria a
elas que não deixassem de saborear os risos, as gargalhadas, os toques, os
olhares, as falas, os sons e cheiros que circulam em cada recanto dos cantos
onde vivem e aos quais podem pertencer. Olharia nos olhos de cada uma e diria
para respirarem profundamente a vitalidade emergente do lugar que pode ser o
melhor no mundo.
Ele ficou na sacada até algumas luzes começarem a ser acesas. Era momento de se
organizar para o jantar e rever os passos do dia seguinte” (NOGUEIRA, 2012).
Parabéns, Barra Velha! Parabéns Folha Parati! Espaços de
vida, de troca, de encontro. Espaços de compartilhamento das possibilidades e
dos sonhos. Barra Velha, nosso ninho – espaço de pertença e de existência.
Lugar de produção de sentidos e significados. Folha Parati, espaço-meio de
diálogo e de informação; prática social fundamental na construção da cidadania
crítica e atuante.
NOGUEIRA, Valdir.
Analogia perfeita entre ninho e o lugar de pertença; de fato, o ninho representa, de uma forma significativa, a nossa casa, a nossa cidade, o nosso lugar-vida em suas condições naturais e culturais peculiares - mas que tem uma relação íntima com nossa casa Terra, sem a qual não estaríamos aqui pensando o que pensamos...
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