segunda-feira, 28 de março de 2011

SABERES E FAZERES EM BARRA VELHA



             A comunidade é um lugar híbrido em vários sentidos. Vou citar alguns: a) na cultura – a música, a dança, a cozinha, os contos, as lendas, os sítios arqueológicos (sambaquis), as tradições e crenças, enfim, as muitas formas com as quais o povo barravelhense viveu e vive as marcas que lhe são próprias, lhes dão identidade; b) na história – marcas deixadas pelos colonizadores e principalmente, pelos habitantes do lugar, expressos, por exemplo, na casa de palmito, na antiga igreja – hoje presente apenas na memória de alguns ou nas fotografias guardadas em acervos de algumas famílias tradicionais, nas esculturas colocadas ao longo das praias, no monumento do Morro do Cristo, nas heranças sócio-históricas lembradas pelos velhos, nas representações simbólicas e culturais do porto das canoas, nas reminiscências do passado que ficou como pistas para se compor o mosaico do que fora um dia essa comunidade-cidade; c) no meio ambiente – rico em paisagens naturais e sociais – da orla marítima aos mais longínquos recantos do interior, na fauna e flora que se conserva do pouco que resta de mata atlântica, no valor do solo fertilizado pelos rios, riachos e lagoa; nas praias e recortes do litoral, entre outras características bioantroposocioambientais encontradas nesse espaço vital; d) na sociedade – a formação do povo barravelhense – caracterizada em tempos e espaços diferenciados pela mobilidade em tempos de verão e inverno; pela organização econômica, política, cultural, pelos diferentes modos de viverem em comunidade – de um bairro ao outro, de um canto ao outro do município, pelo trabalho que desempenham, dando uma configuração própria ao que vemos e conhecemos como Barra Velha.
            Essa hibridez pode ser mais ampla se considerarmos, nesse contexto, os saberes oriundos dessa composição socioambiental. Chamo atenção para os saberes populares e aqueles originários das experiências vivenciadas nos muitos espaços-lugares do lugar Barra Velha. Estejamos onde estivermos, seja na praça central, no costão dos náufragos, na praia do Grant, no interior onde encontramos engenhos de farinha ou roças artesanais, na colônia dos pescadores, nas rodas de conversa com os velhos moradores, vamos encontrar e nos depararmos com muitas experiências de vida.
            Isso se torna ainda mais forte quando, por exemplo, pensamos nos saberes da experiência, próprios do que se vive nos dias de hoje no contexto da cidade e que, de certa forma, interferem nos modos de ver, entender e perceber Barra Velha como um lugar comum, como comunidade de destino, como espaço de pertencimento.
            A narrativa que recebi há pouco tempo e que foi postada no blog, é contundente e reflete traços característicos de um saber-administrar que, em outros momentos deixou marcas profundas em muitos sujeitos barravelhenses. Uma experiência de trabalho público que retrata bem o que é viver a relação opressor-oprimido que Paulo Freire denunciava e denuncia em suas obras.
            Dos saberes e fazeres em Barra Velha, apontados pelo leitor do blog, vou destacar alguns que considero fundamentais, ou dito de outro modo, fundantes no sentido de basilares em uma ética responsável com o lugar e as pessoas que nele vivem/habitam. Uma gestão em todos os âmbitos da máquina pública requer, no mínimo, cuidado com os graves erros já cometidos para que, como apontava outro leitor, a partir de Hans Jonas, possamos pensar um futuro mais seguro e promissor no contexto da cidade na qual moramos e pertencemos.
            São eles: a) o saber-fazer-viver a cidadania, no sentido de fazer parte da construção do lugar, sentir-se agenciador e sujeito de escolhas e de proposições, de intervenção; b) o saber-fazer a política partidária e a política enquanto ação cognitiva democrática e libertária de modo a não vender o voto, mas assumi-lo como direito e instrumento de transformação; c) o saber-fazer compartilhado em termos de tomar decisões para, com e no lugar, sentido de não se pensar apenas para si, mas na coletividade, não impor decisões, mas discuti-las e assumi-las no coletivo; d) o saber-agir de forma responsável e comprometida com as instâncias político-públicas – escolas, prontos-socorros, postos de saúde, creches, unidades de turismo e cultura, diretorias etc.; e) o saber-respeitar a realidade sem deformá-la e alterá-la em pseudosdiscursos e pseudoações – sentido de trapacear, modificar o que é pelo que não é a realidade que se vive e se administra; f) o saber-fazer-construir a liberdade humana coletivamente ao invés de oprimi-la e torná-la diminuida, insignificante e descartável – sentido de negar as pessoas e sua liberdade de ação, de participação, sua voz e seu grito na sociedade; g) o saber-fazer-segunça no sentido de que as pessoas vivam, convivam e sintam que estão em um lugar que lhes dá segurança, lhes faz sentir-se seguros sem lhes tirar o sossego – sentido de não viverem coagidos, represados; h) o saber-fazer econômico-político, respeitando e valorizando os sujeitos, as pessoas nos seus estados de vida e de participação; esses e outros tantos podem ser ampliados a partir do que o leitor, atento ao blog, definiu como educação ecológica, como reinvenção da arte da política.
            É fundamental que se pense e entenda que o fazer político em uma dada realidade não se caracteriza apenas como ato eleitoreiro ou como ação mecânica de votação/eleição de alguém ou alguns. Ela é, antes disso, atitude de governança de si mesmo e que se transforma em ação de responsabilidade por si e pelos outros.
            Uma ação que não pode negar-se os vários níveis de REFLEXÃO, ANÁLISE e COMPREENSÃO da realidade onde se vive. Considero imprescindível que os sujeitos, os cidadãos barravelhenses pensem na direção de um saber-fazer-agir politicamente referenciados, que busquem indagar, questionar, problematizar suas realidades de vida. Esconder-se é negar-se, e a negação de si mesmo produz continuidade de formas de agir que não faz bem e não produz um bem-viver socioambiental. Pensar Barra Velha enquanto ato de saber-fazer não está fechado numa linearidade cartesiana de um dizer SIM ou NÃO, pelo contrário, é ação de quem se faz presente por sentir que pertence e habita um lugar que lhe é comum, não é só seu, mas de muitos outros.

NOGUEIRA, Valdir.
Db.Nog.  

PENSANDO BARRA VELHA: TEMAS E TRAMAS



O texto a seguir é uma contribuição que fortalece este espaço de trocas e, a mais, que nos ajuda a entender o sentido do que seja a participação e o envolvimento na luta por vida digna e de qualidade. Amiga Geozani, sou imensamente grato pela troca e pela co-pertença.


Amigo Valdir,

            Considero de fundamental importância contribuir neste grande desafio de pensar Barra Velha pelo fato de considerar o valor da minha cidadania. Atualmente, não moro em Barra Velha, mas meu título de eleitor continua vigente nesta comunidade. Não consigo pensar e sugerir soluções para as mazelas nesta relação de pertença ao local, sem pontuar o agravante que os cidadãos enfrentam. A politicagem vergonhosa e explícita é vivenciada em todas as instancias.
            De acordo com o poder vigente, a oposição sofre fortes represálias, o que cala a voz desse grupo. Poderíamos chamá-los de covardes, no entanto, vivenciei pessoalmente as ameaças ao exercer minha profissão como sujeito/pessoa concursada no município. Mal tinha assumido minha lotação, deparei-me com uma função a mais, a qual não escolhi e sequer participei de qualquer processo para o provimento de membros de um dos conselhos que compõe o espaço escolar. Percebi que não havia convocação para reuniões decisórias, principalmente de licitações, mas havia o chamado para conferir ou verificar os mantimentos chegados com um caminhão em escolas. Para meu espanto, as frutas e verduras estavam murchas e/ou podres. Alguns itens com a data de validade vencidas e itens faltando e/ou em quantidades insuficientes. Preparei um relatório e fui entregar a quem estava apto a assumir as responsabilidades enquanto gestor da educação. Para minha surpresa, já ia ser convocada, mas não para discutir meu relatório e sim para assinar uma série de documentos e notas de compra que não condiziam com o real, por conseqüência, contrário ao relatório então produzido. Ousei negar-me assinar a papelada e saí do local ouvindo a seguinte frase: “Reza a lenda que muitos estão amanhecendo na lagoa com a boca cheia de formigas de forma misteriosa”. Entendi o recado embora não temesse nem um pouco por mim, mas era responsável por meus filhos. Decidi então pedir exoneração, uma vez que já sabia muito para permanecer com segurança nesta linda e sossegada comunidade.
            Citar este fato, meu amigo, significa trazer a luz, questões de ordem mais grave e urgente. É lindo e também segue as normas acadêmicas citar um milhão de pensadores que discutem os problemas mundiais. No entanto, crianças, adolescente, pescadores e trabalhadores de nossa comunidade talvez não sintam essa relação de pertença nas discussões trazidas aqui. Este espaço deveria convidar cidadãos de nossa comunidade para pensar o purolento câncer que provoca o descaso econômico, social e político local.
            Diante destes fatores dificutores de um pensar Barra Velha como nosso pequeno paraíso, analisar o trânsito, os desmandos na pavimentação, a melhoria nos pontos turísticos, uma política comprometida e responsável, requer sim, uma re-educação que resgate relações de pertença ao lugar. Consciência de que, enquanto cada um pensa em tirar proveito para si de cada situação, principalmente em época de eleições, nada contribuirá para mudanças significativas.
            Penso numa alfabetização ecológica que desperte desde os primeiros anos de vida uma relação de pertença ao lugar, família, comunidade que construa uma interdependência do meio sócio-cultural-ambiental. Uma educação diferenciada da que temos até agora que considera  uma natureza humana diferenciada da natureza em si. Isso levou o humano a uma supremacia de poderio sobre todas as coisas, onde a vida natural acontece fora dele.
            O humano é o pensante, o transformador/destruidor/construtor, no entanto, deveria ser o cuidador, preservador, protettor uma vez que reconheça sua interdependência disso tudo. Nós humanos, somos natureza frágil, diferente da natureza em si que segue sua espontaneidade natural onde tudo acontece independente de nossas intervenções. Somos totalmente dependentes dessa natureza sadia em seu curso. Uma geração que possa sentir fortemente esta interdependência e fragilidade diante do espaço natural que ocupa, poderá reinventar A POLÍTICA, num sentido de: A Arte de Bem governar o que existe de melhor e necessário para sobrevivência e transcendência dos cidadãos de Barra Velha e do mundo.
            Os temas que brotam das tramas vivenciadas no contexto dessa comunidade são muitos e não podem ficar aprisionados nas masmorras da opressão e repressão. Somos todos chamados a um envolvimento solidário e cidadão nessa construção coletiva do bem-viver e pertencer ao espaço-lugar comum que é Barra Velha. 


Contribuições enviadas pela leitora e co-escritora Geozani de Fátima. 

terça-feira, 22 de março de 2011

Cartão Vermelho




“Valdir, diante da fragilidade e vulnerabilidade de nosso Planeta é, de fato, urgente uma outra ética - uma ética de responsabilidade de todos sujeitos-cidadãos nas relações entre si e com a natureza; pois, só dessa maneira teremos condições de possibilitar a vida, com qualidade, às gerações futuras. Valem as palavras de Hans Jonas (2006): “Aja de modo a que os efeitos da tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma autêntica vida humana sobre a Terra” [...] “ Aja de modo a que os efeitos da tua ação não sejam destrutivos para a possibilidade futura de uma tal vida” [...]; “ Não ponha em perigo as condições necessárias para a conservação indefinida da humanidade sobre a Terra”; “[...] Inclua na tua escolha presente a futura integridade do homem como um dos objetos do teu querer.””


Amiga Sônia,

            Agradeço a contribuição para seguir pensando Barra Velha como nosso lugar comum, como nossa comunidade de destino - usando uma expressão de Morin (2000). Hans Jonas nos ajuda a pensar nessa ética da responsabilidade e, a mais, nos ajuda a entender o que significa nos comprometermos com tal perspectiva de vida. A expressão que citei anteriormente, de Morin, nos faz pensar sobre o valor da comunidade, o sentido e o significado que estão interrelacionados à importância de saber pertencer, tal como discuti com a amiga Geozani, em outro momento. O que percebo é que falta entender, em profundidade o significado do que seja uma “autêntica vida humana”, o que compreende uma “possibilidade futura” de vida, desde o momento presente, incluindo nesse aspecto, a responsabilidade da “escolha presente” e, com isso, atentar para o risco do “perigo” que se corre caso as ações e atitudes se tornem práticas irresponsáveis, levianas e desajustadas.
            O presente é fundamental para tomarmos decisões que nos ajudarão a fortalecer lógicas sustentáveis de vida comunitária. O que me impressiona é que, de modo geral, muitos gestores, técnicos ou políticos parece não perceber ou não querem perceber o grau de responsabilidade das suas ações no presente; não compreendem ou não querem compreender a importância dos atos que praticam ou dos conchavos que fazem, tornando-os atos relativizados, banais. Não é preciso muito esforço para entender que a minha ação não provoca reações e reflexos apenas em minha vida, em minha história. Ela pode envolver outros contextos, outros espaços, outros lugares.
            Uma ação é carregada de uma multiplicidade de interferências, de reflexos. As pessoas ainda pensam isoladas, agem isoladas e o que é pior, numa lógica individualista, mercantil e pensando apenas em seus interesses pessoais. Enquanto se caminha nessa direção, certamente corremos sérios riscos, tiramos a autenticidade do viver, do estar e do pertencer, negamos possibilidades de futuro e, com isso, potencializamos a possibilidade do perigo.
            Barra Velha, enquanto unidade, enquanto lugar-comunidade singular poderia e deveria ser exemplo de administração/gestão pelos governantes e pelos seus munícipes. Uma gestão participativa, democrática e colocada numa perspectiva da cidadania comunitária. As redes sociais, culturais locais deveriam ser fortalecidas. Poderia haver um chamamento à participação, ao envolvimento comprometido, enfim, engajamento. Isto porque, somos todos responsáveis por essa cidade e pelos reflexos dela em outras instâncias, outros contextos, outras localidades. Não estamos isolados. Não vivemos em uma ilha. Como seria bom se a cidade fosse modelo de governança socioambiental!  Como seria maravilhoso se nossa cidade fosse procurada como exemplo de comunidade de destino – sentido de que ela pode apontar modelos e formas de se fazer gestão, qualificando a vida no presente e para o futuro. Para isso ser possível, seria bom pensarmos um pouco o que está presente nos princípios da Carta da Terra, como segue no primeiro princípio:

  1. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DE VIDA

1.      Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.

a)     Reconhecer que todos os seres estão interligados e cada forma de vida tem valor, independentemente do uso humano.
b)     Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.

2.      Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.

a)     Aceitar que com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais vem o dever de impedir o dano causado ao meio ambiente e de proteger o direito das pessoas.
b)     Afirmar que o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder comporta responsabilidade na promoção do bem comum.

3.      Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.

a)     Assegurar que as comunidades em todos os níveis garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais e dar a cada um a oportunidade de realizar seu pleno potencial.
b)     Promover a justiça econômica propiciando a todos a consecução de uma subsistência significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.

4.      Garantir a generosidade e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações.

a)     Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração está condicionada pelas necessidades das gerações futuras.
b)     Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que dêem apoio, a longo tempo, à prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra.

            A carta segue com outros princípios profundos e que servem de orientadores para uma gestão/administração do lugar de forma equilibrada, consciente e prudente. Como tenho ouvido nos eventos de Educação Integral que tenho participado no MEC, “É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança” (Provérbio Africano). Talvez, precisamos compreender Barra Velha, enquanto nosso lugar comum, nessa perspectiva de aldeia, de comunidade e, a partir desse entendimento, dessa compreensão profunda, assumir as responsabilidades que temos uns para com os outros. Por enquanto, no jogo estabelecido entre os díspares e não entre os pares da política barravelhense, o que se pode fazer é dar cartão vermelho. Que o presente nos ajude e chegar, quem sabe um dia, ao cartão verde. O perigo é que estão caminhando na direção da “zona azul”. A lógica bem sabemos qual é.  

quinta-feira, 17 de março de 2011

Pensar Barra Velha



 “Barra Velha, nosso pequeno Paraíso...'Muito poucos sabem pensar, mas todos querem ter opiniões. - Arthur Schopenhauer'”.

Esse texto é um comentário-dialógico que teço a partir das contribuições de uma amiga de Londrina/PR. Uma pessoa que muito me ajudou e ajuda a pensar.

Geozani,

Você, a partir de Schopenhauer, toca em uma questão de fundo que é fundamental para os dias atuais. Principalmente se pensarmos em um processo de gestão local que pode fundamentar-se em lógicas ou formas de pensar que pouco contribuem para o desenvolvimento significativo do mesmo. Isso toca numa questão de fundo epistemológico, num ponto onde se entende que é fundamental aprender a pensar. Vivemos em um contexto democrático, logo, seria crucial pensarmos em uma democracia cognitiva em que, ao aprender a pensar - sentido de saber-pensar de forma cidadã, os sujeitos, em geral, poderiam inserir-se social e cognitivamente nas discussões, nos embates, nas trocas, nas proposições, enfim, na elaboração de ideias e propostas que desencadeassem formas cidadãs no trato com as questões públicas locais. A opinião é sempre carregada de senso comum e de generalidades. O pensar exige análise, compreensão, apreensão da realidade. O ato de pensar exige ainda, fundamentos que lhe dêem suporte, que lhe sirvam de referencial para tecer uma dada elaboração ou posicionamento. Não são poucos os que preferem as práticas ao invés das reflexões e análises. Pensar exige esforço e sistematização. No caso da gestão do lugar, poderia se pensar que, saber-pensar poderia se constituir como um dos elementos fundantes da lógica administrativa. Para toda ação, não uma reação, mas um pensar comprometido, responsável, prudente. A lógica cartesiana implantada em muitos sistemas é aquela da fazeção – “vamos fazer e fazer obras e mais obras”, sem pensar nas conseqüências, nos reflexos, na multiplicidade de reações que são desencadeadas a partir de cada ato, de cada ação desenvolvida. Como enfoca Morin (2005), numa democracia cognitiva, os cidadãos não estariam mais condenados à ignorância dos problemas vitais. É isso que falta em muitas instâncias. Um povo que concebe a cidade enquanto contexto educador – o bairro, as ruas, as vielas, os pontos turísticos, enfim, tudo que constitui a cidade e seu contexto torna-se ambiente educador, torna-se espaço de prática da democracia. Não é apenas problema do governo uma obra em determinada rua ou espaço público, é problema de todos porque diz respeito à vida de todos, por isso, precisa ser pensado junto, precisa ser pensado no coletivo. Nesse contexto, concordo com Morin (op.cit.), no sentido de que se precisa pensar numa ética da resistência à barbárie. Já chega de amadorismo, já chega de fazer de conta que se administra, já chega de balelas quando se trata da coisa pública, do espaço de vida de todos. A população, o povo em geral, quando educado para o saber-pensar, pode e deve agir no sentido de resistir eticamente a toda forma de esgarçamento da vida; a toda forma de corrupção e desvio de conduta. Para isso, é preciso que se caminhe na direção de uma sensibilização socioambiental enquanto ato inicial de um processo do saber-pensar para o pensar-bem a vida e seu meio. Barra Velha é, de fato, um paraíso, mas tem ficado a mercê de lógicas infratoras, contrárias a uma democracia cognitiva – parece que manter o povo na ignorância garante melhor o direito aos cargos e vagas no administrativo. O pensamento elaborado e que tem como base um conhecimento ou um dado saber sobre os fatos, fenômenos e acontecimentos ajuda de modo mais específico a enxergar as variáveis, a interpretar as causas, a dar direcionamentos. Aprender a aprender administrar faz bem e não gera ônus inapropriados. Finalizo com uma citação do Morin (2005, p. 170-171) que considero ímpar: “Essa reforma das mentes pode ser conduzida pela educação, mas infelizmente o nosso sistema educacional terá de ser previamente reformado, pois está baseado na separação: dos saberes, das disciplinas, das ciências; produz mentes incapazes de conectar os conhecimentos, de reconhecer os problemas globais e fundamentais e de apropriar-se dos desafios da complexidade”, Na seqüência, continua o autor citado: “A reforma do espírito é um componente absolutamente necessário para todas as outras reformas. Leva a um modo de pensamento que permite compreender os problemas planetários e tomar consciência das necessidades políticas, sociais e éticas; isso é ainda mais importante na medida em que o papel da consciência humana é agora primordial para a salvação do planeta”. Saber-pensar implica no desenvolvimento de uma outra ética e outra consciência de mundo e da vida.

Obrigado, minha amiga, por partilhar suas ideias e provocar as minhas.
Valdir

sexta-feira, 11 de março de 2011

O faz de conta no trânsito de Barra Velha


        O amadorismo na gestão do trânsito em Barra Velha mostra, contundentemente, o descaso com o dinheiro público. O desrespeito com a contribuição do cidadão barravelhense. Exige-se e briga-se na justiça para que se efetive o valor a ser cobrado e pago pelo imposto de renda – o que deveria e deve implicar em desenvolvimento da cidade – no entanto, o que se percebeu com as pseudoreformas foram os gastos desnecessários com mão de obra e artefatos de sinalização que estão sendo retirados das vias públicas que voltam a funcionar no formato anterior à mudança realizada.
            Será que não se poderia, antes, fazer croquis e mapas provisórios visualizando-se o que se provocaria e no que resultaria tal mudança? Será que não se poderia desenvolver análises de perspectiva em sentido de se perceber se tal finalidade seria efetiva ou deveria ser descartada? O planejamento serve para isso. Serve para se prever, perceber, antever, organizar, detalhar, estruturar, enfim, dar direcionamentos que, no mínimo, evitem tais desperdícios.
            Barra Velha passa por uma experiência estranha de gestão em muitos dos seus segmentos. Parece que a cidade se tornou palco ou laboratório de experimentos em que muito pouco se apresenta em termos de resultados satisfatórios. Em um laboratório, estudam-se várias possibilidades até que uma seja a mais assertiva. Mas isso não pode acontecer no contexto de um ambiente público. Por isso, as cartas, os mapas, as plantas, os croquis, os desenhos, as projeções são elementos que ajudam no sentido de se encontrar um caminho que seja favorável e que alavanque o desenvolvimento socioambiental de um contexto municipal ou de uma cidade.
            Fico impressionado com o que se faz com o dinheiro do povo. Como se fará a prestação de contas desses gastos? Colocam-se placas, desvios, mudam-se as rotas, utiliza-se de tintas, de combustível, e muito mais. Tudo isso em vão? O que falta para se fazer um trabalho cuidadoso e competente no contexto dessa cidade? Barra Velha tem uma beleza sociocultural e socioambiental únicas. É uma cidade linda e merecia, pelos menos, cuidado na forma de fazer as melhorias.
            O que se constata in locu, é que, pensar um pouco, ou refletir cuidadosamente sobre as ações poderia, no mínimo, evitar exageros e atitudes precipitadas e pouco ajustadas à dinâmica da cidade.  Nessa direção, entendo a urgência de uma gestão compartilhada e prudente quando se trata de mudanças ou transformações no ambiente de vida das pessoas. Mas para que isso aconteça é preciso, primeiramente, que se reformem os pensamentos e depois as instituições. Em outras palavras, é preciso aprender a pensar, como enfatiza Edgar Morin. Enquanto isso não se concretiza, vive-se um faz de conta em termos de mudanças consistentes, seja na gestão do trânsito ou em outras instâncias. O que significa essa mudança? Muda o quê? Muda para quem? O Saber-Pensar, enquanto exercício político faz bem e ajuda no processo de desenvolvimento humano e social.